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Casais com olhar viciado

  • Foto do escritor: Raquel Mazo
    Raquel Mazo
  • há 2 dias
  • 3 min de leitura

Já percebeu como a nossa percepção fica contaminada pelas vivências que tivemos?

Se você visitou uma cidade e viveu um assalto, provavelmente ficará com a sensação de que aquele lugar é violento, e talvez não queira voltar. Enquanto outra pessoa, que nunca passou por isso, pode guardar uma impressão completamente diferente.


A realidade é complexa, e percebê-la depende dos aspectos que escolhemos notar. Como não temos controle sobre tudo ao nosso redor, criamos mapas internos para nos protegermos de surpresas. Há momentos em que isso é muito útil, e outros em que pode nos atrapalhar.


Nos relacionamentos, esse olhar marcado pelas próprias experiências pode distorcer muito a construção do vínculo. Um casal, ao longo da convivência, vai criando convicções sobre quem o outro “é”, e essas ideias tendem a se fixar, produzindo repetições indesejadas.


É assim que surgem frases como: “ele sempre esquece de tirar o lixo”, “ela nunca me escuta”, “ele é sempre frio”, “ela é sempre crítica”. Essas afirmações são convicções que, por serem absolutas, impedem que o parceiro seja visto em sua complexidade. O olhar fica viciado, e tudo o que foge do padrão passa despercebido.


Se fosse apenas uma questão de percepção, já seria um desafio. Mas há um ponto ainda mais delicado: o olhar viciado também molda o comportamento do outro. Inconscientemente, o parceiro passa a agir como aquilo que já é esperado dele. Afinal, se a mudança não é percebida, com o tempo ele pode desistir de tentar fazer diferente.


A música abaixo ilustra exatamente esse movimento: quando um ato renovado é acolhido com surpresa e abertura, algo se transforma.


Um dia ele chegou tão diferente Do seu jeito de sempre chegar Olhou-a de um jeito muito mais quente Do que sempre costumava olhar E não maldisse a vida Tanto quanto era seu jeito de sempre falar E nem deixou-a só num canto Pra seu grande espanto convidou-a pra rodar Então, ela se fez bonita Como há muito tempo não queria ousar Com seu vestido decotado Cheirando a guardado de tanto esperar Depois o dois deram-se os braços Como há muito tempo não se usava dar E cheios de ternura e graça Foram para a praça e começaram a se abraçar E ali dançaram tanta dança Que a vizinhança toda despertou E foi tanta felicidade Que toda cidade se iluminou E foram tantos beijos loucos Tantos gritos roucos como não se ouvia mais Que o mundo compreendeu E o dia amanheceu em paz (Valsinha - composição de Francisco Buarque de Hollanda / Marcus Vinicius da Cruz de Mello Moraes

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A renovação do olhar é o que possibilita que a relação volte a respirar. Quando nos permitimos observar o parceiro com outros olhos, abrimos espaço para perceber pequenas exceções, nuances, tentativas. E esse deslocamento discreto, porém profundo, pode mudar toda a dinâmica do casal.


Na terapia de casal, uma das tarefas centrais é identificar as convicções que foram se instalando silenciosamente em cada um. Elas viciam o olhar, engessam o vínculo e mantêm a relação presa em comportamentos que machucam e que ambos acreditam que “nunca vão mudar”.


Quando o casal começa a enxergar essas lentes e compreender como elas operam, surge a possibilidade de um encontro novo. E, muitas vezes, é a partir desse novo olhar que a relação encontra caminhos que antes pareciam impossíveis.


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